ENTRE EM CONTATO

CONTATO

Para propostas comerciais, sugestão de casos ou para elogios ou até mesmo reclamações, preencha o formulário.

ENTRE EM CONTATO

CONTATO

Para propostas comerciais, sugestão de casos ou para elogios ou até mesmo reclamações, preencha o formulário.

ENTRE EM CONTATO

CONTATO

Para propostas comerciais, sugestão de casos ou para elogios ou até mesmo reclamações, preencha o formulário.

Se eu te pedir pra pensar em uma enfermeira, acho que é bem natural que você vá pensar em uma mulher doce, atenciosa e que faz de tudo ao seu alcance pra levar conforto e cura aos seus pacientes

Se eu falar pra você pensar em uma enfermeira de bebês, então, é comum que a primeira imagem que venha a sua cabeça é a de uma mulher segurando a mão de uma mãe após o parto, ou então tomando conta de um recém-nascido com muito amor, até que o bebezinho já tenha condições de ficar sob os cuidados da sua família.

Pois bem: essa é uma história de uma enfermeira diferente, que chocou o Reino Unido e um caso que teve seu veredito definido recentemente, no final de agosto de dois mil e vinte e três. É a história de uma serial killer. De uma mulher que não só fez coisas absurdas através da sua profissão, como também trouxe uma dor irreparável pra muitas famílias.

Lucy Letby nasceu em Hereford, no Reino Unido, no dia quatro de Janeiro de mil novecentos e noventa (ou seja, hoje ela tem trinta e três anos). Filha única de Susan e John Letby, Lucy estudou na Universidade de Chester e se formou em enfermagem. 

Chester é uma cidade que fica no Noroeste da Inglaterra e é considerada uma das cidades mais bonitas e turísticas do país, com várias construções medievais.Lucy é uma jovem branca, com cabelos na altura dos ombros e tingidos de loiro, na época dos acontecimentos que vou relatar aqui.

Aparentemente, Lucy tinha uma vida bastante comum ali nos seus vinte e cinco anos. Tudo indicava que ela tinha um bom relacionamento com os pais, era simpática, sorridente, se dava bem com os colegas de trabalho e - era solteira, até onde as pessoas sabem - mas sempre viajava com amigos, ia na academia e tinha uma vida social bem ativa.De acordo com uma dessas suas amigas chamada Dawn, em uma entrevista pro The Daily Mail, Lucy sempre quis ser enfermeira e ajudar bebês, principalmente porque o próprio parto da mãe dela quando a Lucy nasceu foi um parto muito complicado. A amiga disse que Lucy sentia que era o que estava destinada a fazer.

Enquanto se formava, ela fez alguns estágios e treinamentos no Hospital para Mulheres de Liverpool e, em dois mil e onze, no Hospital Condess of Chester ou, traduzindo, Condessa de Chester, local onde ela se especializou em cuidados infantis. Entre dois mil e doze e dois mil e treze, Lucy até mesmo foi o rosto usado pelo Condessa de Chester pra divulgar uma campanha de arrecadação de fundos. Fundos, esses, que seriam usados pra construir uma nova área neonatal do hospital.

Em dois mil e quinze, já especializada e ainda no Condessa de Chester, Lucy migrou pra área de cuidados intensivos neonatais. Esse, é de fato o local onde começa nossa história: o palco de todos esses acontecimentos terríveis. A área de cuidados intensivos neonatais era dedicada a bebês recém-nascidos que precisavam de uma atenção especial por algum motivo: geralmente porque eles nasciam prematuros ou então já nasceram apresentando alguma doença.

Nesse setor, Lucy tinha como suas principais funções observar os bebês mais doentes e - como enfermeira especializada - realizar mentorias a enfermeiros e enfermeiras mais jovens. De acordo com a versão digital do jornal Daily Mail no Reino Unido, aquela unidade neonatal do Condessa de Chester dava luz a mais de dois mil bebês por ano. Analisando os registros do hospital, foi descoberto que ele teve duas mortes de bebês no ano todo de dois mil e treze e três mortes de bebês no ano de dois mil e catorze. E, até então, as coisas estavam acontecendo de forma relativamente normal no hospital… pelo menos até aquele ano.

Vale comentar aqui, gente, que esse é um caso delicado e que restrições legais impedem a divulgação na mídia dos nomes ou qualquer outro detalhe sobre os bebês e suas famílias, que possa ajudar a os identificar. Então, claro que eu não vou citar nenhum dado das famílias além do que é liberado e amplamente divulgado nos veículos ingleses. Bom, tudo começou em oito de Junho de dois mil e quinze, logo assim que Lucy começou no departamento de cuidados especiais.

Fazia noventa minutos desde que ela tinha começado seu turno da noite e nele ela iria cuidar de um bebêzinho, um menino, que tinha uma irmãzinha gêmea. Eles nasceram prematuros e de uma gravidez de risco. A mãe deles tinha uma uma rara doença no sangue e o menino logo foi encaminhado para a UTI, enquanto sua irmã, que estava melhorzinha, aguardava em outra área do setor neonatal.Apesar de ser um caso especial e delicado, os médicos consideraram o estado do menino como estável e todos diziam que ele ficaria bem.

Nesses casos de risco, é comum que cada bebê tenha uma enfermeira ali com ele o tempo todo, e no caso do menino, a enfermeira era Lucy.Pouco tempo depois, os pais do menino foram avisados que ele tinha sido encontrado sem vida, pelos enfermeiros. E a gente saberia que isso aconteceu devido à embolia gasosa: que é quando existem bolhas de ar nas veias impedindo a circulação sanguínea, principalmente no pulmão. Os médicos tentaram salvar ele, mas era tarde demais. Como enfermeira responsável, Lucy ainda tirou um molde da mão e pézinhos do bebê, assim como um cacho de cabelo, com o consentimento dos pais, e depois os entregou a eles. Ela declarou, na época, como uma “perda muito difícil” e achou que a atitude seria um gesto bonito, pra dar a eles algo do filho perdido. Era uma situação muito dolorosa para aqueles pais.

E, como se não bastasse, vinte e sete horas depois da morte do menino, sua gêmea entrou em um quadro crítico após desmaiar subitamente. Ela ficava a maior parte do tempo sob vigia dos pais, principalmente após a morte do irmão. Mas em um momento em que eles foram instruídos a descansar, ela ficou somente sob os cuidados das enfermeiras. E foi aí que o pior quase aconteceu.Lucy Letby não era a enfermeira designada a atendê-la, mas ela dava assistência à enfermeira responsável, que estava ocupada e deixou a bebê nas mãos de Lucy.

Esse meio tempo foi o suficiente para que um alarme de aviso aos médicos disparasse, indicando que algo havia acontecido e que a bebezinha não estaria respirando. Por sorte, os médicos conseguiram reanimá-la a tempo, mas ela apresentava manchas na pele e tinha um estado muito semelhante ao do irmão.Em busca do que teria ocorrido, os pediatras do Condessa consultaram diversos profissionais de outros hospitais e nenhum conseguiu explicar o que aconteceu com os bebês, principalmente com a morte do menino.

Aos pais, eles disseram que provavelmente era uma complicação devido a doença do sangue da mãe, mas o motivo real ainda era um mistério.Esses pais ainda criaram turnos entre si, pra vigiar a menininha e nunca mais deixaram a bebê longe de suas vistas no hospital, até que ela recebesse alta. Imagina que preocupação terrível a dessa mãe, que havia passado por um parto super delicado, difícil, perdeu um de seus bebês e agora criava turnos com seu parceiro pra vigiar a outra bebê, né? Pelo menos, de acordo com os depoimentos dos pais, a menininha não sofreu consequências do que aconteceu com ela e hoje em dia está bem.

Seis dias depois desse acontecimento com os irmãos, outros gêmeos prematuros chegaram até o Condessa de Chester e tiveram a Lucy como enfermeira. A mãe deles sempre visitava seus bebês na UTI neonatal e certo dia ela encontrou os dois chorando, eles pareciam assustados e nervosos, de acordo com a mãe, e enquanto isso a Lucy estava parada ao lado das incubadoras. Um deles parecia lutar pra respirar e até sangrava pela boca. A mãe correu pra confrontar Lucy e a enfermeira simplesmente disse algo como “pode confiar em mim, eu sou a enfermeira”. Nervosa, a mãe saiu para ligar pra seu marido.

Os enfermeiros preenchem relatórios sobre o estado dos seus pacientes e no caso de Lucy, não era diferente. Mas seus relatórios sobre aquele caso não citavam nem uma palavra sobre o fato do bebê apresentar um sangramento intenso. Infelizmente, o bebezinho não resistiu. Em sua autópsia, a causa da morte foi dada como asfixia devido à embolia gasosa, ou seja, mais uma vez pela injeção de ar nas veias. Assim como da primeira vez, seu irmão gêmeo apresentou as mesmas complicações, pouquíssimo tempo depois, mas sobreviveu.

Em menos de vinte e quatro horas desde a morte do irmão, o bebê foi encontrado com altíssimos níveis de insulina no sangue. E isso era bastante incomum, sendo que nenhum bebê na unidade intensiva estava sendo tratado com adição de insulina. E, afinal, era muito estranho que vários bebês estivessem tendo um tipo de colapso do nada, não é? O que teria ocorrido? O que eles tinham em comum? Uma doença? Uma complicação? Bom, o que eles tinham em comum era Lucy Letby.

Uma enfermeira aparentemente normal que, quando ninguém estava olhando, injetava bolhas de ar nas veias dos seus pacientes ou os envenenava com insulina.Nessa época, em dois mil e quinze, Lucy ainda tinha um hábito muito estranho e que mais tarde pesaria em seu julgamento: ela pesquisava e praticamente “stalkeava” no Facebook, com muita frequência, os pais dos bebês que haviam falecido.

Após esses casos, a próxima vítima de Lucy foi uma bebezinha que nasceu prematura e foi transferida para o Condessa após uma série de inflamações e complicações. Ao chegar lá, ela já apresentava melhoras, até ser colocada sob os cuidados da enfermeira. A menininha foi encontrada sem respirar, com sufocamento por aplicação de leite em suas vias respiratórias. A bebezinha sobreviveu, mas ficou com danos irreparáveis revelados através de ressonâncias.

Outro bebê chegou pouco tempo depois no Condessa e logo apresentou um quadro gravíssimo. Ele também estava sendo supervisionado por Lucy. Em outro momento, Lucy tentou matar quatro vezes uma bebê com injeções de ar em seu estômago. A cada tentativa, outros enfermeiros apareciam para intervir e ajudar a reanimar o bebê, até que Lucy voltava a ficar sozinha com a criança e tentava de novo. A quarta tentativa foi a última, na qual ela de fato conseguiu tirar a vida da menina. 

Nesse mesmo caso, outros enfermeiros sugeriram que a mãe da bebezinha desse o último banho em sua filha e ela aceitou. De acordo com um depoimento posterior dessa mesma mãe, ela ficou um pouco incomodada porque, no momento em que ela tava dando esse último banho na bebê, a Lucy teria entrado no banheiro do hospital e falado super feliz que ela, Lucy, tinha dado o primeiro banho na recém-nascida e que a bebezinha tinha ficado super feliz. Gente, logo depois de ter feito o que ela fez, sabe?

Em outubro, o doutor Stephen Brearey que trabalhava no hospital começou a levantar algumas suspeitas sobre a Lucy e a notificar o Condessa de Chester, mas nada foi feito.Apenas naquele ano de dois mil e quinze o hospital relatou oito mortes de bebês recém-nascidos, um número muito maior do que os registros indicavam como o normal pro Condessa. Desses oito, cinco deles foram vítimas nas mãos da enfermeira Letby.Muitos casos estranhos haviam acontecido desde Junho e todos seguiam o mesmo padrão: obstruções das vias respiratórias, manchas na pele ou até aumento no nível de insulina.

Os bebezinhos tinham colapsos mesmo em casos nos quais estavam bem de saúde, antes de chegarem no Condessa. Vale lembrar que muitas das causas das mortes permaneciam um mistério, já que os bebês sempre estavam com complicações pós-parto, e era um pouco difícil suspeitar (pelo menos no início) que as mortes não eram naturais.

Mas, depois de algum tempo, surgiram uma série de indícios de que envenenamento e injeções de ar poderiam ter sido administradas ali. Talvez, então, o hospital também estivesse sendo negligente, não é? E isso ainda piora com uma declaração de mais um dos médicos em Fevereiro do ano seguinte, dois mil e dezesseis. 

O pediatra Ravi Jayaram, que é bastante conhecido no Reino Unido por dar palestras e entrevistas, trabalhava no Condessa, na ala neonatal. Um dia, ele relatou à administração do hospital que ele estava se sentindo muito desconfortável com a presença de uma enfermeira e seus plantões, já que muitos deles coincidiam com mudanças graves nos estados dos bebês - e algumas em mortes. E essa enfermeira, é claro, era a Lucy.

O doutor Ravi também estudou e mostrou pra administração análises do sangue e raios X dos bebês doentes, onde ele viu níveis muito altos de gases nos sangues. E isso indicaria que os bebês tinham ar injetado nas veias, provavelmente por alguém. Justamente o modus operandi da Lucy né gente? O Ravi, inclusive, já tinha presenciado um momento em que um bebê que era um de seus pacientes estava sozinho com Lucy, e seu quadro de saúde começou a agravar muito, com sérios problemas pra respirar e ainda com o tubo de respiração desencaixado (o que seria até comum pra bebês que estão se movendo muito, mas não era o caso desse bebezinho que estava sedado no momento em que o médico o encontrou). 

O Ravi ainda chegou a questionar a Lucy sobre o que ela estaria fazendo ali e por que o bebê estava daquele jeito e ela simplesmente disse que “aquilo tinha acabado de acontecer”. Dias depois, esse bebezinho foi encontrado morto e com o tubo de respiração super deslocado pra dentro da sua garganta.Mas agora, vocês acham que o hospital recebeu esse relato de braços abertos e intensificou as investigações, afastando a Lucy?

Pois pasmem: o Ravi simplesmente foi instruído pelos gerentes do Condessa a não se manifestar sobre o assunto. E ele assim obedeceu, e nada foi falado para a polícia. Dois mil e dezesseis seguiu com casos extremamente suspeitos de bebês tendo colapsos, desmaiando com falta de ar, passando mal com aplicações de insulina ou sufocando com bolhas de ar que impedem a circulação pulmonar. Em meados daquele ano, uma bebezinha sofreu desse último problema e foi enviada pra outro hospital, onde ela melhorou completamente

Nessa época, existem registros de que mais uma vez Lucy pesquisava no Facebook pelos pais de bebês que ela tinha sido responsável por atacar, incluindo os dessa menininha. Em seus registros no celular foram encontradas duas mil trezentas e oitenta e uma pesquisas por pais de recém nascidos que Lucy havia matado ou tentado matar.

O primeiro médico que tinha suspeitado de Lucy, o doutor Breary, ainda acreditava que a enfermeira tinha alguma relação com as mortes dos bebês. E ele até chegou a mandar e-mails para a diretora de enfermagem, Alison Kelly, e pro diretor do hospital, Eirian Powell. No e-mail para o diretor, mandado em dois de março de dois mil e dezesseis, Breary escrevia “ainda precisamos falar sobre Lucy”.

Fonte: BBC News 

Breary disse que chegou a ser escutado em reuniões com os executivos do Condessa, mas Lucy ainda estava liberada pra trabalhar. Talvez se naquela época eles tivessem escutado os relatos de Brearey, eles teriam salvado algumas vidas. As duas últimas vítimas fatais de Lucy são do fim de Junho de dois mil e dezesseis.

De acordo com a investigação, trigêmeos chegaram ao hospital com quadros estáveis, mas dois deles teriam sido mortos sob os cuidados de Lucy. Um deles até foi encontrado com sangue coagulado no fígado, o que, de acordo com legistas do hospital, poderia ser resultado de massagens de reanimação que causaram alguma lesão. 

Porém, um médico de fora do Condessa foi convidado a analisar a autópsia desse bebezinho, e na opinião dele, aquele ferimento interno só poderia ter sido causado por um forte impacto, ou seja, uma agressão. Assim como as outras vítimas de Lucy, os gêmeos também tinham bolhas de ar nas suas correntes sanguíneas. E da mesma forma como fez com os outros, um ano após a morte deles Lucy pesquisava e stalkeava os pais pelo Facebook.

Até aqui, muitos casos de bebês tendo complicações anormais já tinham acontecido e era impossível que não houvesse desconfiança. Os colegas de trabalho de Lucy já suspeitavam de suas atitudes, como ja comentamos, e ela até mesmo tinha tido um dos seus turnos reduzidos. Após essa morte dos gêmeos, aquele médico Brearey ainda teria falado com Lucy e pedido pra que ela se afastasse.

Ele usou a desculpa de que a morte dos bebês poderia ter deixado ela bastante “chateada”, ou “mexido muito com ela”, mas ela simplesmente disse que estava bem e ele disse que ela parecia super feliz de ir trabalhar no dia seguinte. Breary ainda pediu pra Karen Rees, uma das executivas do Condessa, que suspendesse a Lucy, mas ela se recusou

No total, entre Junho de dois mil e quinze, até Junho de dois mil e dezesseis, Lucy já teria assassinado sete bebês e tentado assassinar outros sete. Mas foi só em Junho de dois mil e dezesseis, passado um ano desde o início dos assassinatos, que os executivos do Condessa solicitaram uma revisão formal das mortes suspeitas naquele período. 

E só pra explicar: isso não significava que a polícia estaria envolvida em uma investigação, e sim que o hospital estava formalmente investigando os acontecimentos. A Lucy ainda trabalhou por três turnos até que finalmente o hospital cedesse e ela fosse removida de vez da UTI neonatal e passada pra outro setor do hospital. Curiosamente (ou não, né) os quadros estranhos de desmaios e mortes de bebês pararam.

Naquele momento, passaram a surgir discussões entre os executivos do Condessa sobre passar a investigação pra polícia. De acordo com o jornal The Guardian, dois pediatras contaram que, naquele mês, um executivo do hospital comentou que chamar a polícia iria destruir a reputação do hospital e transformar a unidade neonatal em uma cena de crime.Um dos consultores da investigação que acontecia dentro do hospital chegou até a mandar o seguinte e-mail pros executivos do hospital: “No momento todos (profissionais) no hospital são suspeitos e creio que a única agência capaz de nos investigar seja a polícia”

Fonte: BBC News
 

Fonte: BBC News

 
E o Diretor Médico do hospital, chamado Ian Harvey, ainda respondeu com outro e-mail pedindo que parassem de mandar e-mails falando sobre a Lucy e o possível envolvimento da polícia. De acordo com ele, “eles já estavam cuidando disso”. “Ah, mas agora a investigação oficial vai finalmente acontecer” você deve estar pensando. Mas, por incrível que pareça, a polícia só seria de fato contatada meses depois, em Janeiro de dois mil e dezessete.

E, quanto à Lucy, nesse período, vocês acham que ela foi suspensa ou afastada por conta das investigações? Ela não foi. Ela simplesmente foi transferida pro “escritório de segurança e risco do paciente” onde muitos policiais e jornalistas acreditam que ela não só ficou segura, como teve acesso a documentos e registros do setor neonatal.

Ou seja, ela poderia ter acesso a documentos da investigação e até mesmo poderia encobrir alguns dos seus rastros. Gente, quando parece que não pode ficar pior, piora.Ainda assim, os executivos do hospital estavam preocupados com sua reputação acima de tudo. Médicos do Condessa contaram ao The Guardian que em Fevereiro de dois mil e dezessete os pais da Lucy Letby, John e Susan, ameaçaram o hospital dizendo que os denunciariam pro Conselho Geral de Medicina após Lucy ter sido removida da UTI neonatal.

Lucy, é claro, alegava sua inocência. E os pais a defendiam com unhas e dentes. E, adivinhem o que os executivos do hospital fizeram sobre isso? O chefe-executivo na época, chamado Tony Chambers, pediu que médicos escrevessem uma carta, em nome do hospital, com um pedido oficial de desculpas pra Letby, no dia vinte e oito de Fevereiro, pedindo perdão por terem levantando suspeitas contra ela. Parece brincadeira, né?



Na carta eles dizem: “querida Lucy, sentimos muito pelo estresse e aborrecimento que você experienciou no ano passado”.Com as investigações independentes que o hospital estava fazendo, eles mal investigavam a possibilidade da Lucy ou de que qualquer outro membro da equipe pudesse ser o responsável pelas numerosas mortes de bebês.

INÍCIO DA INVESTIGAÇÃO POLICIAL

Mas como eu comentei, dois meses depois desse pedido de desculpas, ou seja, em Abril de dois mil e dezessete, enfim a polícia tinha sido envolvida no caso. O hospital foi obrigado a ceder, e agora a investigação aconteceria pra valer. Lembram daquele médico que tinha sido coagido pelo hospital a ficar quietinho sobre o que ele achava da Lucy? O Ravi Jayaram? 

Bom, então, assim que a polícia interviu, ele contou sua versão e, de acordo com o que ele disse pra ITV News, do Reino Unido, em menos de dez minutos a polícia percebeu que eles precisavam sim estar envolvidos naquela investigação. Contrariando anos de posicionamento do hospital, né? Como Lucy sempre foi o fator em comum nas mortes dos bebês, a investigação policial recaiu sobre ela, sua vida pessoal e, claro, possíveis rastros de seus crimes, que ela teria deixado pra trás.

E, só pra reforçar, Lucy passou o ano todo de dois mil e dezessete trabalhando no Condessa, naquele mesmo escritório de arquivos de segurança dos pacientes. Ela ficou lá até dois mil e dezoito, quando as investigações finalmente avançaram.

A polícia analisou dados hospitalares como gráficos, registros de gases no sangue dos bebês desde Junho de dois mil e quinze, anotações, relatórios clínicos e depoimentos de colegas de trabalho.O doutor Brearey continuou ajudando a polícia e pesquisando informações antigas que pudessem provar de vez os envolvimentos de Lucy nas mortes.

Até que um teste de sangue, feito em um dos bebês lá em dois mil e quinze, mostrava aquela alta dose de insulina em seu corpo, que só poderia ter sido aplicada, lembra? A prova do envenenamento, que na época não tinha sido observada pela perspectiva de um assassinato pelos legistas, finalmente seria o bastante pra colocar Lucy atrás das grades. E foi com essas provas, agora nas mãos da polícia, que Lucy foi detida no dia três de de Julho de dois mil e dezoito.

Vídeo da Lucy sendo presa: Enfermeira é condenada por matar sete bebês em hospital no Reino Unido | Mundo | G1

A casa de Lucy, onde ela morava sozinha desde dois mil e dezesseis, foi revistada. Lá, os policiais encontraram alguns itens estranhos que seriam usados contra Lucy no julgamento. Além do diário pessoal de Lucy, que tinha estranhas marcações de nomes de bebês justamente nos dias em que eles haviam morrido, a polícia achou alguns post-its muito perturbadores.

Fonte: Cheshire Police | The Daily Mail UKFonte: Cheshire Police


Os post-its estavam repletos de rabiscos feitos com desespero e tinham frases como: 
"Eu sou má, eu fiz isso. Eu os matei de propósito porque não sou suficientemente boa, não mereço viver, sou uma pessoa horrível."

Ou então: 
"Por favor, me ajudem, não consigo mais lidar com isso, odeio minha vida, quero que alguém me ajude, mas não é possível."

A acusação de Lucy usou os post-its no julgamento como forma de confissão.Lucy ainda saiu e voltou para a prisão duas vezes: uma em dois mil e dezenove e outra em dois mil e vinte, enquanto aguardava o julgamento. Em Novembro de dois mil e vinte, plena pandemia, enfim ela foi acusada de assassinar sete bebês e tentativa de assassinato de outros sete, entre Junho de dois mil e quinze e Julho de dois mil e dezesseis. Inclusive, existem dez suspeitas de tentativas de assassinato, mas a polícia só conseguiu de fato ligar a Lucy a sete dessas dez. 

A polícia ainda revisou todas as quatro mil admissões de bebês nas unidades neonatais dos dois hospitais onde Letby trabalhou entre dois mil e doze e dois mil e dezesseis - o Condessa de Chester e o Hospital para Mulheres de Liverpool. Lucy esperou na prisão até dois mil e vinte e dois, ano em que o julgamento realmente aconteceria. Foram mais de dois anos nos quais a acusação reuniu todas as provas.

O julgamento teve início em Outubro de dois mil e vinte e dois e durou mais de dez meses. Inclusive, acredita-se que esse seja o mais longo julgamento de assassinato da história do Reino Unido.Como já havia provas que a ligavam à cena do crime, só faltava um motivo, uma dica sobre a personalidade de Lucy, que era um mistério até aquele momento.

Além dos post-its que eu já comentei, dos registros médicos, relatórios de autópsia e de outros movimentos suspeitos de Lucy, como as pesquisas sobre as famílias no Facebook, a acusação também trouxe algumas mensagens do celular de Lucy à tona.

Essas mensagens eram de todo o tempo analisado em que a Lucy teria trabalhado na UTI e quase sempre eram com colegas médicos. Como são muitas mensagens, eu não vou ler todas aqui, mas só resumindo: elas demonstraram que Lucy talvez estaria enfrentando alguma sobrecarga emocional. Em algumas delas ela diz que “continua vendo os bebês que faleceram” e que: “Ninguém deveria ter que ver e  fazer as coisas que fazemos. É de partir o coração” “Tudo tem sido um pouco demais


E em outra diz que não entendia como “alguns bebês doentes ficavam bem e outros simplesmente morriam de forma inesperada”. Ela termina a mensagem dizendo que “acho que é como as coisas devem ser”

POR QUE LUCY FEZ O QUE FEZ?

A jornalista Judith Moritz da BBC News cobriu o julgamento em primeira mão e escreveu para um artigo do jornal que Lucy se mostrava completamente sem emoções durante as acusações.

Acompanhada de seus pais, que estavam aflitos, Lucy tinha uma expressão severa e isenta de emoções. De acordo com Judith, o único momento em que Lucy se emocionou foi durante um depoimento anônimo de um médico que tudo indica que era um antigo amigo ou uma paixão de Lucy.

A acusação mostrou trocas de mensagens entre eles e - apesar de ele ser um homem casado - parecia que existiam segundas intenções pelo jeito como conversavam. Mas, como eu já disse no começo do episódio, a Lucy não tinha um namorado, pelo menos não um de quem as pessoas soubessem.

Algumas pessoas, como jornalistas ou simplesmente curiosos na internet, ainda tentaram relacionar esse interesse amoroso como uma possível motivação de seus crimes. Porém, além da troca de mensagens um pouco estranhas, nada indicava um relacionamento na vida de Lucy e muito menos um relacionamento que iria desencadear crimes sucessivos.

De qualquer forma, Lucy não tinha nenhum antecedente estranho, algum trauma que a gente tenha conhecimento. O que torna as ações dela bem misteriosas. Quando depôs a seu favor, Lucy parecia confiante, até começar a se posicionar de forma arrogante e contrariar os depoimentos.

A acusação encontrou uma série de inconsistências e contradições nas suas falas.Durante o julgamento, Letby insistiu que não machucou nenhum dos bebês e falou que a culpa das mortes e das doenças seriam de alguns problemas de higiene no hospital. A sua defesa sempre insistia que Lucy seria uma enfermeira ruim, mas não uma assassina.


FIM DO CASO:

No total, foram catorze dias da Lucy testemunhando e sessenta horas de interrogatório. A acusação reuniu nove meses de evidências e somou vinte e duas acusações de assassinato e tentativas de assassintato. O resultado, saiu somente no dia vinte de agosto deste ano, dois mil e vinte e três. Lucy foi condenada à prisão perpétua pelo assassinato de sete bebês e pelas tentativas confirmadas de assassinato de mais sete. A prisão perpétua é bem incomum no Reino Unido, inclusive. 

No decreto final, o Juíz falou que existem evidências de que Lucy tentou apagar registros confidenciais e anular rastros que a levassem aos seus crimes, além do fato de ela ter stalkeado nas redes sociais os pais em luto; “Tinha uma grande maldade, um sadismo, nas suas ações”, ele conclui. Vou deixar o trecho aqui pra vocês assistirem porque é bastante emocionante a conclusão desse caso.



Desenho do tribunal mostrando Lucy Letby (enxugando uma lágrima) enquanto prestava depoimento no Manchester Crown Court. Seu advogado de defesa Ben Myers KC (à esquerda) também é visto neste esboço do tribunal, assim como o juiz presidente Goss (Justice James Goss). 2 de maio de 2023. Helen Tipper para BBC News

Fontes:
- Judge hands whole-life sentence to Lucy Letby for baby murders
- Babies could have been saved if hospital acted sooner, consultants say | The Independent
- Doctors were forced to apologise for raising alarm over Lucy Letby and baby deaths
- 'Eu os matei porque não sou suficientemente boa': as revelações do julgamento da enfermeira que assassinou 7 bebês - BBC News Brasil
- Lucy Letby: 11 curiosidades sobre caso da serial killer que matou 7 bebês no Reino Unido
- Hospital bosses ignored months of doctors' warnings about Lucy Letby - BBC News → o mais completo.

UM PODCAST COM MISSÃO

Escute agora

CONTATO

Para propostas comerciais, sugestão de casos ou para elogios ou até mesmo reclamações, preencha o formulário.

Casos Reais Podcast · 2022 © Todos os direitos reservados.