Fernanda Lages Veras tinha dezenove anos quando, em vinte e cinco de agosto de dois mil e onze, sua vida chegou ao fim. Na cidade de Teresina, capital do Piauí, sua despedida foi marcada por mistério e suspeições. Sua história envolve política, pessoas economicamente poderosas, desencontros amorosos e uma onda interminável de tristeza para aqueles que ficaram.
Natural de Barras, e filha de um ex-vereador do município, que fica a cento e vinte e sete quilômetros de Teresina, ela se mudou para a capital do estado para cursar a faculdade de Direito no início daquele mesmo ano. Ela é a protagonista de um caso que começa na noite de vinte e quatro de agosto, quando um encontro desagradável acontece…




Fernanda namorava Pablo Leão, um garoto da sua idade, mas o relacionamento terminou porque, segundo ele, Fernanda tinha um estilo de vida mais… diferente. As matérias dão a entender que ele é um rapaz mais sossegado, enquanto Fernanda queria aproveitar ao máximo a juventude, saindo com os amigos para festas e tal.
Nessa noite de vinte e quatro de agosto, ela pediu para conversar com ele com intenção de reatar o namoro, pois ainda o amava muito, mas Pablo fincou o pé e disse a ela que não daria certo. Não adiantaria eles tentarem forçar a situação e terminar, meses depois, do mesmo jeito. O papo, claro, não foi para o caminho que Fernanda gostaria…
Eles tinham se encontrado próximo aos portões da faculdade onde ela estava e, sem consenso entre os dois, Pablo voltou para casa e Fernanda foi, dirigindo sozinha, até uma churrascaria, onde se encontraria com os amigos, provavelmente para desabafar sobre a conversa que acabou de ter com um ex.
De lá, o grupo decidiu ir para uma balada, e Fernanda deu carona a uma amiga rumo ao segundo destino da noite. Tudo normal. Era uma noite de amigos, de gente jovem, que só queria se divertir. Antes de chegar à boate, porém, Fernanda e a amiga pararam em um posto para abastecer o carro.
E, aí, o primeiro incidente da noite, no mínimo BEM estranho, aconteceu.
Enquanto o carro era abastecido, a amiga de Fernanda percebeu que havia um homem no posto, abastecendo uma Hilux preta, que não parava de encarar as duas. Fernanda também percebeu e ficou assustada, então quis ir logo embora do posto. Saindo de lá, elas mantiveram o plano original: seguir até a boate onde os outros amigos já estavam.
Muito tensas, as jovens perceberam que aquela Hilux do posto estava seguindo o carro de Fernanda durante o trajeto. E como se isso já não fosse estranho o bastante, durante as próximas horas, o mesmo cara, no mesmo carro, teria passado diversas vezes na frente do local e teria ficado encarando Fernanda.
A madrugada do crime
O grupo se divertiu, na festa, de onde saíram às quatro da manhã do dia vinte e cinco de agosto de dois mil e onze. Fernanda e os amigos seguiram para um restaurante, desses que ficam abertos a madrugada toda, mas a jovem ficou lá por pouco tempo.
Depois de se despedir do grupo, foi embora sozinha em seu carro. Os amigos dizem que ela parecia muito bem. Não aparentava estar nervosa, nem pela conversa com Pablo, nem pelo episódio com o cara da Hilux, que já havia sido esquecido.
O que ninguém sabia e, aparentemente, ninguém consegue explicar, é porque seu carro seguiu rumo ao prédio da Procuradoria Geral, que, naquela época, ainda estava em construção. Se estivesse pronto, em plena atividade, poderíamos pensar até que, para algum estágio ou pesquisa, já que era estudante de direito, ela poderia ir com esse propósito, mas não era o caso. Não fazia sentido ela estar ali, àquela hora da madrugada, a não ser que tivesse ido se encontrar com ALGUÉM.
Nesse trajeto, ela não infringiu qualquer lei de trânsito, não teve excesso de velocidade, não ultrapassou sinal nem nada, mas foi nesse local que o carro dela estava estacionado – e foi onde a tragédia aconteceu. Às cinco e cinquenta e cinco da manhã, menos de duas horas depois de se despedir de seus amigos naquele restaurante de Teresina, Fernanda foi encontrada MORTA, caída no pátio das obras, por um dos funcionários da construtora que tinha chegado para assumir seu turno.
A cena era clara: Fernanda tinha caído do prédio. Mas o que a polícia, que foi chamada de imediato, ainda precisaria descobrir é se ela caiu, em um acidente, pulou de propósito do alto da construção ou se foi jogada de lá por alguém. A perícia se encarregaria do laudo enquanto todas as pessoas que viram ou estiveram com Fernanda na noite anterior e na madrugada seriam ouvidas em depoimento. Afinal, ainda não sabiam se era um suicídio ou um homicídio.
O primeiro suspeito foi o ex-namorado, Pablo, como é normal em casos assim. Sempre o ex, ou o atual, namorado ou marido da vítima é colocado como a pessoa que poderia ter motivação e oportunidade para cometer um crime. Pablo contou que eles tiveram a conversa sobre reatar o namoro, perto dos portões da faculdade de direito, e depois voltou para casa, e que o álibi poderia ser confirmado por seus pais e pelo vigia da rua onde morava. Apenas os pais confirmaram a informação. Ainda assim, Pablo foi ouvido e liberado por falta de provas ou evidências que pesassem contra ele.
Mesmo porque se Pablo foi a parte do casal que terminou o relacionamento, como os amigos da vítima poderiam confirmar, seria estranho que tivesse qualquer motivação para matá-la. Apesar de não estar feliz com isso, ela tinha aceitado numa boa o fim do relacionamento, ou seja, não tinha criado confusão com Pablo. O segurança noturno da obra, que assumiu o turno antes daquele que de fato encontrou Fernanda, disse para a polícia que viu movimentacão no local, de madrugada, mas foi meio contraditório. Primeiro, disse que viu DUAS pessoas entrando na obra, mas, em outro depoimento, afirmou que era apenas uma pessoa, aparentemente uma mulher.
Questionado sobre porque não abordou essa ou essas pessoas, o segurança justificou que, como o local estava em obras, e não tinha nada para ser roubado de lá, ele não se deu ao trabalho de ir conferir a razão pela qual ela ou elas, as pessoas, tinham entrado naquele terreno. Tanto que o cadeado estava aberto, o que permitiria a passagem não só dessa figura, ou das figuras, que ele viu, mas de qualquer um a qualquer momento. Não sei pra vocês, mas, pra mim, é bem esquisito isso. Tudo bem que ninguém vai sair correndo de lá com um saco de cimento ou dois blocos de concreto, mas se havia segurança em todos os turnos naquela obra, era por um motivo, certo? E o motivo mais básico é: não é um terreno baldio. TEM uma obra. As pessoas não podem entrar aqui a hora que quiserem e pela razão que quiserem.
O mínimo que esse cara deveria ter feito, então, era ir lá, abordar a tal mulher ou as pessoas, se foi mais de uma, e perguntar: tá fazendo o que aqui, minha senhora? Talvez essa aproximação, naquela noite, pudesse salvar uma vida.
Nas escadas que levam ao alto do prédio foram encontradas pegadas compatíveis com os sapatos de Fernanda, o que confirmava que ela tinha subido. Claro. Para cair, se jogar ou ser jogada, ela precisaria estar lá no alto. Mas também tinha outra pegada, de um tênis, possivelmente masculino, de número 42, que potencialmente teria feito o mesmo caminho que ela.
E tem um detalhe: ainda que o cadeado do portão da obra estivesse aberto, como o vigia falou, para poder retirá-lo, junto às correntes do portão, só estando do lado de DENTRO da obra. Ou seja, Fernanda só poderia entrar ali e andar livremente se alguém que estava DENTRO já tivesse deixado o portão escancarado.
Mesmo com essas evidências, a polícia não descartava a possibilidade de Fernanda ter se jogado propositalmente do alto da construção. Algo que atrapalhou bastante, até mesmo para que a polícia estivesse mais certa dessa conclusão, era que, como é típico em desastres, muitas pessoas se aglomeraram ali para ver o cadáver de Fernanda, colocando ainda mais pegadas no local, fora que o corpo estava repleto de pessoas ao redor, que podem ter mexido nela ou destruído alguma prova de crime.
Então até mesmo aquela pegada do tênis, que poderia levar a algum suspeito, acabou se tornando apenas mais uma possibilidade, e não uma prova cabal de que alguém estava lá com ela. As impressões digitais e o rastreamento das chamadas de telefone seriam os caminhos viáveis para uma possível solução do caso, que nunca veio.
Na investigação, até seu computador foi pego para perícia, para que profissionais especializados em perfis psiquiátricos pudessem confirmar ou descartar a hipótese do suicídio – que os amigos e familiares da vítima achavam improvável. Ela estava, sim, triste pelo término com Pablo, mas era jovem, cheia de vida, começando a estudar uma carreira com que tinha sonhado a vida inteira. Nunca demonstrou com veemência qualquer ideal suicida. Pra completar, incidentes esquisitos, como o da Hilux, tinham ocorrido às vésperas de sua morte.
O carro também foi periciado, sem vestígios de mais alguém dentro dele além da própria Fernanda ou da amiga que pegou carona com ela até a balada. Nas conversas anteriores àquela madrugada de agosto, uma potencial pista foi encontrada: ela conhecia um homem chamado Jivago e era um dos engenheiros responsáveis pela obra onde ela tinha acabado de ser encontrada morta. E, mais cedo, na noite anterior, eles tiveram um breve encontro.
Geralmente aqui nós damos o nome todo dos envolvidos, mas dessa vez eu vou abrir uma exceção e só falar o primeiro nome da pessoa porque ele não foi condenado. Esse homem, Jivago, já conhecia Fernanda. Não se sabe ao certo como, ou porque, já que as informações são muito desencontradas sobre isso, mas eles acabaram se encontrando em um dos bares em que Fernanda estava na noite anterior à morte.
Jivago é engenheiro e foi um dos responsáveis técnicos da obra. Era de uma família bem de vida e com raízes políticas no Piauí, e por muitas vezes afirmou, após ser considerado suspeito, que essa era mais uma perseguição política de alguns jornalistas que não gostavam dele do que de fato uma suspeição de crime. Mas fato é que ele foi visto no bar, com Fernanda, conhecia ela, tinha acesso à obra e, se por acaso tivesse algum affair com ela, como foi pintado na época, ele poderia ter cometido um crime passional.
Claro que um suspeito relativamente famoso, de uma família de renome, deixou a população e a mídia, bem agitada. O povo de Teresina, assim como a família de Fernanda, passou a ter certeza de que se tratava de um homicídio e que tudo seria feito para acobertar e não punir o, abre aspas, assassino rico e poderoso, fecha aspas. Sendo essa apenas a percepção da população, levada a acreditar na hipótese pela mídia, que perseguia Jivago, ou não, a verdade é que a própria polícia jogou gasolina nesse fogo quando, uma semana depois da abertura das investigações, o delegado responsável pediu afastamento do caso.
Esse delegado afirmou, na época, que sua repartição não tinha, abre aspas, estrutura para tal investigação, fecha aspas. Os suspeitos apareciam, mas mais na mídia do que de fato na polícia, que parecia estar satisfeita com a hipótese do suicídio. Devido à pressão da imprensa e da população, o caso foi passado para a CICO, Comissão Investigadora do Crime Organizado de Piauí. Lá, uma nova equipe apurou e identificou que os registros de ligações feitas por Fernanda foram APAGADOS de seu aparelho.
Massssss a recuperação seria feita diretamente com a operadora, que colocaria não só o telefone de Fernanda como o de seus contatos por telefone naquela noite em áreas próximas ou bem distantes. Isso serve para o que a perícia chama de TRIANGULAR, que é botar pessoas suspeitas no mesmo local ou nas proximidades de onde estava a vítima de acordo com os sinais de seus próprios telefones.
Assim, daria para descartar suspeitos ou incluir pessoas que, até então, não estavam sendo investigadas. As possibilidades de encontrar um suspeito nunca foram admitidas pela polícia. Eles até chegaram a interrogar, além dos engenheiros e funcionários da obra, um homem que tentou ficar com Fernanda na noite do crime, mas que foi posteriormente descartado como suspeito, assim como outras pessoas das festas que ela frequentou antes de morrer.
Tudo indicava, para quem visse de fora, que o caso vinha sendo tratado como homicídio e que a polícia teria o laudo para abertura de inquérito em quinze dias. Depois, ofereceria a denúncia ao Ministério Público, e as investigações seguiram daí. Mas as autoridades pediram mais trinta dias para fechar esse laudo. Eles queriam anunciar ou oferecer publicamente a denúncia se realmente existisse um culpado viável para o crime. Só que eles não tinham certeza NEM se havia um crime ali.
As divergências sobre suicídio ou homicídio ocorriam não só na população, mas entre os próprios investigadores, que, não bastasse ter duas alternativas já muito graves em mãos, ainda levantaram uma terceira hipótese: Fernanda foi jogada por alguém que a utilizaria em uma rede de tráfico humano.
O promotor de justiça que servia ao Ministério Público na época do ocorrido revelou que Fernanda queria viajar para a Europa e, recentemente, tinha tirado o passaporte e viajou para Fortaleza, capital do Ceará, onde teria recebido um dinheiro para ir para a Itália. Isso foi visto como indício de que ela poderia ter sido envolvida em uma rede de tráfico de mulheres, especialmente porque havia fotografias dela com alguns dos principais suspeitos de comandar a tal rede.
Para o promotor, Fernanda pode ter sido vítima de uma queima de arquivo, em um crime por encomenda. Nesse caso, teria sido atraída até a obra, levada ao topo e de lá, ter sido jogada por alguém, para que os rastros dela com os líderes da rede de tráfico fossem devidamente apagados. Essa hipótese ficou mais forte quando testemunhas deram a entender que o comportamento de Fernanda tinha mudado drasticamente nos últimos meses, especialmente depois de uma festa em um sítio, na periferia de Teresina, onde supostamente tinha feito novas amigas.
Suas antigas amizades sabiam que esse tipo de festa envolve figurões da alta sociedade piauiense, drogas, álcool e sexo, e que essas tais novas amigas poderiam tê-la aliciado para um esquema de prostituição internacional. A família dela continuava achando que se tratava de um homicídio, mas que nada tinha a ver com uma rede de tráfico de mulheres ou algo do tipo. Para eles, quem matou a jovem tinha OUTRA motivação, ainda que ninguém soubesse exatamente qual.
A amiga Naira
O laudo emitido pelo Instituto Médico Legal do Piauí logo após a morte informou que Fernanda tinha lesões produzidas ANTES de sua morte pela queda do edifício em construção. As marcas seriam de algo de forte impacto, como se alguém estivesse batendo nela com uma barra, por exemplo, ou caso fosse jogada das escadas que dão acesso ao prédio.
Uma testemunha foi primordial para que uma agressão entrasse na linha do tempo do crime. Essa pessoa deu uma informação à polícia, quando o caso ganhou notoriedade, e viu as notícias sobre o assunto. Era um vigia de outros prédios da região. Ele informou que passou pelo local antes do acontecido e viu Fernanda sentada na calçada, próxima a uma árvore, e que ela não estava sozinha.
Tinha um rapaz e uma moça ali também, que conversavam entre si. Ele foi colocado frente a frente com os amigos e amigas de Fernanda, que estavam com ela durante a noite, e não reconheceu nenhum dos rapazes. Contudo, disse ter certeza de que uma das moças era a que estava com a jovem naquele dia.
Naira, amiga de Fernanda, ficou extremamente nervosa quando foi reconhecida e acusada por esse vigia. Ela chegou a ser detida por continuar negando que estivesse naquele local e sem dar o nome do rapaz que também estava lá. O que faz sentido, caso ela realmente não estivesse, porque se você não está em um lugar você não pode identificar quem de fato estaria…
Vendo-se como suspeita de possível homicídio, Naira contratou um advogado de uma empresa de cidade vizinha, que conhecia Fernanda, também. Muitos acharam estranho essa escolha de profissional, mas a menina precisava de alguém para fazer sua defesa… No tempo em que ficou presa, e a investigação continuou, a ideia que a polícia passava era a de que algum suspeito forte estava na mira da culpa. Algumas matérias de jornais locais chegaram a dizer que a polícia JÁ SABIA quem era, já tinha o nome do autor do crime, e que, em breve, seu nome seria divulgado.
Então, vamos lá: os suspeitos até então eram:
- O cara que havia insistido para a Fernanda ficar com ele,
- O cara da Hilux do posto, que seguiu Fernanda e a amiga,
- Um dos engenheiros da obra onde o corpo foi achado, que, segundo amigos, se conheciam e se encontrou com ela,
- Os supostos líderes de um suposto esquema de tráfico humano,
- A amiga e o rapaz desconhecido com quem o vigia viu Fernanda
Para se ter uma ideia, até ritual de magia surgiu como especulação. Levantou-se a possibilidade de que Fernanda tivesse sido vítima de SACRIFÍCIO HUMANO, mas ninguém sabia dizer quem ou qual grupo teria feito isso ou a razão pela escolha dela, se de fato fosse algo assim.
Permanece o mistério
A morte de Fernanda em agosto de dois mil e onze trouxe várias teorias à tona. E o que não faltavam eram possibilidades para que alguma suspeita se tornasse mais sólida. A quebra do sigilo telefônico, os contatos próximos de acordo com as redes de celulares, o computador, o carro, as câmeras de segurança do posto… tudo isso soou como uma ponta de esperança em desvendar o caso, mas NADA aconteceu.
Tudo não passou de suposição, informação e especulação. Até hoje, doze anos após o ocorrido, se você estiver ouvindo esse episódio em julho de dois mil e vinte e três, é difícil falar sobre o caso Fernanda Lages porque todos os registros, matérias e participações de pessoas de interesse em podcasts mais recentes parecem absolutamente desconexos.
É como se cada pedaço de informação estivesse ligado a um caso diferente, e não ao mesmo, da mesma vítima. A polícia e o Ministério Público não apontaram suspeitos ou culpados de um potencial homicídio, mas também não chegaram a um veredito sobre a ocorrência de um suicídio.
Todo mundo que era investigado, e que a imprensa local noticiava como suspeito, saía do radar da polícia, já que nunca foi encontrada uma prova de que cada um dos indivíduos citados como suspeitos estivesse com Fernanda naquele canteiro de obras.
Por outro lado, até Naira, a amiga que o vigia dizia ter visto com ela e mais um rapaz em uma calçada ali perto, e negava ter participado de qualquer crime, dizia não acreditar que aquele seja um caso de suicídio. Solta por falta de provas, ela foi uma das amigas que cobrou mais investigações da polícia para encontrar o culpado.
Um laudo da Polícia Científica saiu meses depois do ocorrido e, de acordo com a reconstituição e o estado em que o corpo foi encontrado, o documento afirmava que Fernanda Lages não tinha sido jogada. Que podia ter pulado ou caído acidentalmente.
Nesse caso, as marcas de impacto forte que o IML descreveu anteriormente seriam em decorrência da queda, falando exatamente o contrário do que tinha examinado o legista, pois naquele primeiro documento ele foi enfático ao dizer que essas marcas foram feitas por agressão pré-morte, apesar de os traumas fatais terem sido, mesmo, da queda.
Esse laudo caiu em descrédito por parte da população e pela família de Fernanda que, a essa altura, acreditava que a polícia empurraria a teoria do suicídio para livrar a cara de um ou mais culpados, seja porque eram de família influente, tinham muita grana ou as duas coisas.
Em resumo, cada laudo feito apontava para uma possibilidade de morte. A polícia estava tão confusa quanto a gente, sem saber para onde ir, e a única certeza que todo mundo tem até hoje é que, na cena do crime, não foi encontrado nenhum DNA de possíveis envolvidos. Mas, devemos lembrar, a cena do crime foi contaminada por todas aquelas pessoas que apareceram para ver a tragédia enquanto a polícia ainda não tinha chegado.
A CICO, Comissão de Investigação do Crime Organizado, concluiu em seu relatório que se tratava de homicídio de autoria desconhecida – mas, sem ter para onde ir, se retirou do caso. O órgão, inclusive, foi extinto anos depois. No meio dessa confusão toda, a Polícia Federal entrou no meio, para ver se conseguia mais alguma informação que ainda não tinha sido ventilada pela polícia local. Com a presença da PF, se houvesse alguém poderoso e rico envolvido, talvez essa pessoa não pudesse utilizar sua influência mais.
A polícia federal chegou a pedir a exumação do corpo e novas análises para um laudo cem por cento novo e que pudesse dar alguma resposta ao caso. Mas, quando entraram na jogada, uma série de coincidências fez com que o caso, em vez de rumar para uma solução, ficasse ainda mais envolto em mistério.
Um deles envolve um fotógrafo de baladas que estava presente em uma das festas em que Fernanda estava naquele vinte e quatro de agosto de dois mil e onze. Como era bem comum naquela época, com poucos smartphones com boas câmeras, esses fotógrafos tiravam fotos aleatórias da balada e subiam em sites para que cada pessoa achasse os registros em que estivessem, salvassem e tal.
Então a polícia chegou à conclusão de que valia a pena dar uma olhada nessas fotos, vai que tem alguém ou algo ali que pudessem indicar o culpado ou culpada pela morte da Fernanda… mas, antes que pudessem ver as fotos, o fotógrafo foi encontrado MORTO, de causa não informada, e a perícia notou que diversas fotos tinham sido apagadas do arquivo.
Outra coisa estranha é que o inquérito feito anteriormente tinha mais de seis mil páginas e, quando esse documento chegou às mãos da Polícia Federal, os promotores disseram que várias folhas SUMIRAM do processo. Outras pessoas envolvidas no arquivo juravam que estava tudo lá. Chegou em um ponto em que existiam divergências até sobre a integridade das páginas do inquérito policial.
E, nesse quiprocó todo, teve delegado processando promotor, jornalista, suspeito processando jornalista, jornalista indo pra cima de suspeito, tudo porque a cada hora uma nova teoria surgia e, com ela, várias pessoas ficavam pistolas na sequência. Até os promotores do caso decidiram que iam se afastar, em julho de dois mil e treze, porque não tinham estrutura para investigar e a coisa toda tinha virado uma enorme confusão.
Por fim, a análise comportamental que a Polícia Federal fez ao analisar os equipamentos de Fernanda, seu celular, computador, histórico médico, etc., demonstrou que a jovem tinha comportamento alterado e tendências suicidas.
Somado aos laudos anteriores, este acabou por fazer a PF entender que era mesmo um suicídio e deixar por isso mesmo. A notícia foi chocante para a população de Teresina e para os promotores do Ministério Público que não se contentaram com essa versão.
Em dois mil e dezessete, em entrevista, um dos promotores afirmou que, naquela época, ele tirou férias e, ao retornar, percebeu que uma parte do inquérito havia sumido. Ele ficou desanimado, pois acreditava que alguém estava tentando colocar um ponto final na investigação e no trabalho que eles estavam fazendo até então.
O outro promotor do caso se aposentou alguns anos depois e, com o fim de sua carreira, preferiu não falar mais sobre o assunto. O Ministério Público, na figura dos promotores, não acreditam que o laudo da polícia federal sobre suicídio dê encerramento ao caso, mas há mais de seis anos não apresentam provas novas. Apesar de alegações públicas e notórias, os suspeitos nunca foram oficialmente apresentados, e pistas sobre eles jamais foram reveladas.
Mesmo declarado fechado pela PF, o caso Fernanda Lages ainda é, para seus familiares, amigos e para a população de Teresina, um dos crimes sem solução mais misteriosos do Piauí.
Caso você tenha qualquer informação sobre o que de fato aconteceu a Fernanda Lages ou algum detalhe que possa ajudar os investigadores nesse caso, procure a polícia e dê o seu depoimento. A família de Fernanda merece saber a verdade para que ela possa, finalmente, descansar em paz.
Fontes
FERNANDA LAGES – QUAL SERÁ A VERDADE? – YouTube
http://portalmorrodochapucom.blogspot.com/2011/08/caso-fernanda-lages-ex-namorado-sera.html