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Essa é a história de um homem que, desde muito cedo, demonstrou claros sinais de ser uma ameaça a si mesmo. Com o passar dos anos, acabou por ameaçar a vida de centenas de pessoas que confiaram a ele sua própria saúde. No Casos Reais de hoje vamos contar a história de Charles Cullen, o enfermeiro da noite.

Vale ressaltar que esse roteiro foi feito antes da estreia do documentário sobre a pesquisa para a produção do filme, que estava prevista para o dia onze de novembro. Então, o que falaremos aqui é baseado em entrevistas, matérias e documentos públicos disponíveis na internet e nos canais de streaming, descontando este documentário mais novo, tá?

Este episódio é com roteiro e pesquisa da Laís Menini.

A gente começa a contar a história de Charles Edmund Cullen dizendo que, ainda que não existam provas cabais para bater o martelo nos números, é possível que estejamos falando do maior serial killer da história dos Estados Unidos.

Talvez, do MAIOR SERIAL KILLER DO MUNDO.

Isso porque as autoridades estimam que ele matou muito mais gente do que o confessado. A diferença é muito bizarra: ele confessou QUARENTA crimes, mas é possível que tenha causado a morte de cerca de QUATROCENTAS vítimas. E você vai entender ao longo desse episódio porque os números são, de qualquer forma, bem assustadores.

Charles Edmund Cullen nasceu em fevereiro de mil, novecentos e sessenta, em Nova Jersey, e a vida já começou dando uma bela rasteira nele ainda quando bebê. 

Seu pai, Edmond, que era motorista de ônibus, faleceu aos cinquenta e oito anos, quando Charles tinha por volta de sete meses de idade. Detalhe: ele era o caçula de oito filhos quando isso aconteceu, e vinha de uma família muito simples, com diversas restrições orçamentárias.

Algumas fontes dizem que ele classificou sua infância como “miserável”, e logo aos nove anos de idade ele atentou contra a própria vida pela primeira vez. Não seria a última.

Quando sua mãe, Florence, tinha cinquenta e cinco anos, e Charles, dezessete, ela acabou falecendo em uma OUTRA tragédia familiar: um acidente de carro. Uma coisa que Charlie até chega a citar no filme Enfermeiro da Noite, e que está em várias matérias, é que o hospital para onde ela foi levada não informou a ele sobre o óbito. As narrativas divergem quanto à forma com que ele descobriu a morte da mãe. No filme, ele diz que encontrou a mãe completamente nua e praticamente jogada em uma maca, sem nenhuma dignidade. Outras fontes dão a entender que o hospital PERDEU o corpo de Florence por algumas horas e, em seguida, encaminhou o cadáver para cremação SEM pedir qualquer autorização à família. 

Fato é que esse foi mais um dos momentos traumáticos da vida de Charles, e novamente ele tentou suicídio. Desesperado e desamparado pela morte da única pessoa que de fato cuidava dele, Cullen interrompeu os estudos e se alistou na Marinha dos Estados Unidos.

Só que, lá, também não deu muito certo, não. Mesmo sendo um oficial das forças armadas, seu comportamento era um tanto quanto… ESTRANHO.

Em uma ocasião, enquanto estava a bordo de uma embarcação, um de seus oficiais achou Charles SENTADO nos controles de mísseis vestido como um médico: com máscara cirúrgica, luvas e aventais, como um membro da equipe de emergência, e não em seu uniforme de MARINHEIRO.

Isso foi o bastante para que Charles fosse dispensado por apresentar INSTABILIDADE MENTAL. Depois, ele tentou se matar pelo menos mais sete vezes antes de decidir voltar aos estudos e se formar enfermeiro.

Transição com desenvolvimento 

Eu vou abrir um parêntese aqui: não dá pra ficar contando quantas vezes Charles atentou contra a própria vida. Sério, foram muitas, e cada fonte diz uma coisa. Foi em torno de VINTE VEZES. 

Mas, voltando ao ponto em que ele saiu da Marinha e se recuperou de uma nova tentativa de tirar a própria vida, Charles aparentava ter voltado minimamente aos trilhos. Ele fez um curso de enfermagem, onde se destacou bastante e foi até presidente de sua turma, e se tornou cuidador da saúde. Algumas fontes relatam que foi na faculdade que ele conheceu a mulher que viria a ser sua esposa e mãe de suas duas filhas, mas o nome dela e das crianças, ou até mesmo se ela também se tornou enfermeira, afinal, não são informações divulgadas por aí. 

Isso também não é importante para a história. O que importa é que ele formou uma família. Ou seja, vivia uma vida normal: recém-formado em enfermagem, casado, rapidamente virou pai… tudo o que a sociedade considera como a conduta padrão para uma pessoa sem grandes posses. 

Quando ele se formou, em 1987, existia uma grande demanda por enfermeiros por parte dos hospitais. Assim, Charles não teve problemas em se colocar no mercado de trabalho. Durante seu período de atividade, que foi de mil, novecentos e oitenta e oito a dois mil e três, ele passou por DEZ hospitais.

A forma com que ele passa de um hospital a outro é meio nebulosa, porque não fica claro porque as instituições não foram atrás de informações sobre esse entra-e-sai de empregos. Existem algumas teorias para isso.

A primeira é de que existem leis nos Estados Unidos que impedem ao empregador verificar o histórico de candidatos e funcionários em diversos aspectos, incluindo histórico médico familiar e mapa genético e idade, principalmente para pessoas acima de quarenta anos. Nas pesquisas que fizemos, há registros de que, antes de Cullen, essa lei também abarcava pessoas na área da saúde. Ou seja, não era possível escavar o passado de quem trabalhasse como médico, enfermeiro e etcétera. 

Outra teoria endossada por especialistas é que, por faltar força de trabalho na enfermagem, naquela época, os hospitais não tinham muito apego ao histórico dos funcionários, porque precisavam preencher as vagas rapidamente.

E uma teoria que o próprio filme levanta é que as instituições até DESCONFIARAM de Charlie por vários motivos e que corriam boatos sobre ele, mas que mandá-lo embora era uma opção economicamente mais viável do que submeter a empresa a investigações e escrutínio público, coisas que poderiam levá-las ao prejuízo financeiro.

Vale lembrar que, nos Estados Unidos, o sistema de saúde não funciona como o SUS, no Brasil, e que todo procedimento médico tem um custo pago pela pessoa que procura o atendimento. Então, se uma suspeita recai sobre um hospital, as pessoas param de recorrer a ele e, consequentemente, a instituição perde muita grana.

Mesmo que os hospitais não fizessem muito esforço para checar o histórico de vida de Cullen, uma hora as coisas começaram a ficar realmente esquisitas, inclusive dentro da casa dele. Em 1993, a esposa de Charlie pediu o divórcio e buscou formas judiciais de impedi-lo de ver as filhas. Algumas fontes relatam que a razão para esse pedido é que, abre aspas, ele tinha um comportamento instável, estranho, e tratava os cachorros da família com crueldade, fecha aspas. 

Para uma pessoa com o histórico de instabilidade mental dele, não é difícil adivinhar que esse foi mais um episódio que serviu como gatilho para comportamentos duvidosos. Há um registro contra ele na polícia, ainda em 1993, quando Charlie invadiu a casa de uma colega de trabalho, onde ela dormia com o filho, e saiu de lá sem acordá-los. Quem é que invade uma casa, à noite, para simplesmente observar os moradores dormindo e ir embora?

As queixas foram retiradas, mas o estrago estava feito. 

Anos depois, durante alguns meses de 1997, ele ficou sem emprego, o que o impediu de pagar a pensão às filhas. Isso fez com que ele tentasse tirar a sua própria vida mais uma vez. E ele não foi mandado embora porque, sei lá, o hospital precisava cortar verba, mas porque já tinha gente percebendo uma, digamos, peculiaridade dos plantões de Charles Cullen:

era uma tremenda coincidência, para dizer O MÍNIMO, que muitas mortes ocorressem enquanto ele estivesse responsável pelas rondas.

Aí, você pode até dizer: 

Ah, Erika, mas é um hospital. Pessoas morrem em hospitais. Isso é normal.

Bem… até é. O caso é que, sob a tutela de Charles, pessoas morriam DO NADA. Por exemplo: uma pessoa já muito enferma, com doença terminal, mas estável, acabava tendo uma piora significativa nas rondas de Charles e, PUFF, morria.

Estima-se que a primeira vítima de Cullen tenha sido JOHN DÁBLIO IENGO, de 72 anos, em junho de mil, novecentos e oitenta e oito. Seu obituário publicado no jornal The New York Times informa que a morte se deu em decorrência da síndrome de Stevens-Johnson, que causa uma severa reação alérgica a medicamentos e/ou infecções.

De acordo com o Portal MD Saúde, abre aspas, “a síndrome ocorre de forma rara, aguda e imprevisível, em aproximadamente uma em cada um milhão de pessoas”, fecha aspas. O site ainda elenca substâncias que podem trazer essa reação à tona, e é possível que algum deles tenha sido usado por Cullen para causar o óbito. 

Um parêntese curioso é que no obituário de JOHN IENGO o jornal de Nova York coloca a vítima em péssimos lençóis ao afirmar que, abre aspas, “ele foi nomeado para o Tribunal Municipal em 1974 e era frequentemente chamado de Maximum John por causa da gravidade de suas sentenças. Ele foi suspenso quatro anos depois e eventualmente deposto pela Suprema Corte de Nova Jersey como “totalmente inadequado” por causa de descortesia com os réus e seus advogados e “múltiplos abusos do processo judicial”, fecha aspas.

Óbvio que isso não justifica seu assassinato ou qualquer coisa do tipo, mas é curioso o fato de que ele mereceu apenas esse highlight sobre sua vida no jornal mais importante do estado de Nova Jersey. 

Quem viu o filme nota que o recorte que a narrativa faz é em torno de duas pacientes, Ana Martínez e Kelly Anderson. Ambas são fictícias, mas foram colocadas ali justamente para demonstrar as características principais das vítimas de Cullen.

A maioria tinha o perfil bem parecido com John Iengo, representado na produção por Ana: uma pessoa idosa, com questões de saúde pertinentes a essa fase da vida.

Mas também tinham as vítimas jovens, sem condição terminal, como é o caso da Kelly, do filme. Na vida real, foi MÉTÉU MÉRER, de vinte e dois anos, que teve o destino interrompido pelo enfermeiro da noite. Ele tinha sofrido um acidente de carro, em 1999, deu entrada no hospital em que Charlie trabalhava e, veio a óbito por circunstâncias atípicas ao seu estado de saúde.

Outra vítima, que pode ser a MAIS JOVEM de Cullen, foi Michael Strenko, de apenas vinte e um anos. Em dois mil e três, ele entrou no hospital em que o enfermeiro trabalhava para fazer uma ESPLENECTOMIA, que é a retirada total ou parcial do baço. Esperava-se que Michael, que era atleta e uma pessoa em geral saudável, se recuperasse e tivesse alta. PORÉM, o que aconteceu é que ele foi ficando cada vez pior e chegou a entrar em coma. 

Em uma reportagem de dois mil e onze no portal POCONO RECORDS, os pais de Michael, Mary e Tom Strenko, disseram que, na época, não entendiam como o quadro do jovem tinha evoluído para óbito – mas que, depois do julgamento de Charlie, e da sua confissão, eles tinham finalmente ENTENDIDO.

Na matéria, Mary e Tom contam que se encontraram com o enfermeiro nas primeiras horas do dia em que Michael veio a falecer, no dia quinze de maio de dois mil e três, e relataram uma cena assustadora. Abre aspas: “quando os médicos tentaram, em vão, ressuscitar Michael, Cullen nos olhou bem nos olhos e começou a dizer como nosso filho estava gravemente doente e as pessoas não sobrevivem. Ele estava dizendo que tipo de drogas estavam usando, entrando em detalhes”, fecha aspas.

Olhando em retrospecto, faz sentido que Charlie pudesse detalhar esse tipo de coisa, já que seu modus operandi girava em torno de intervenções medicamentosas relacionadas a super dosagem de fármacos ou administração equivocada das substâncias. 

O que Charles Cullen fazia, segundo o próprio declarou em juízo, era pegar substâncias altamente letais em superdoses e dar a pacientes que não precisavam delas ou que, se precisassem, não era tanto assim.

Ele confessou cerca de QUARENTA mortes de pessoas de várias idades por esse método.

E qual era o motivo? Pasme: nenhum. O enfermeiro não tinha objetivo nenhum em matar pessoas, além da própria vontade. Ele não assassinou pessoas por dinheiro, por status, por prestígio. Ele não tinha uma finalidade específica para o emprego de seus meios torpes. Ele simplesmente queria fazer, foi lá e fez. 

JUROU DE PÉ JUNTO, literalmente, sobre a Bíblia e tal, durante o julgamento, que estava fazendo um FAVOR a esses pacientes e que na realidade estava poupando essas pessoas do sofrimento da morte lenta e dolorosa que as aguardava, em virtude da natureza e do progresso de suas doenças.

É. A alegação não se sustenta. Primeiro porque não cabe a ele decidir sobre a vida e o sofrimento dos outros, principalmente quando a opinião médica dele não foi solicitada. Segundo porque as investigações mostraram que boa parte das pessoas assassinadas por Cullen NÃO estava em estado terminal. Óbvio que, mesmo se estivessem, a atitude dele não seria aceitável de qualquer forma, mas o fato de que muita gente entrou no hospital em que ele estava para receber algum tratamento mais simples, tipo o Michael, com a retirada do baço, e saiu de lá MORTA é muito assustador.

O ciclo se repetia em todos os locais de trabalho de Cullen: aparentemente, a Unidade de Tratamento Intensivo da instituição tinha uma taxa baixa de morbidade e, durante a presença dele, essa taxa subia a níveis surreais. Quando ele saía, as coisas pareciam voltar ao normal. 

Conforme os colegas aumentavam a desconfiança sobre a atuação do enfermeiro, os hospitais o demitiram, o que agravava sua depressão e ele entrava em ciclos de novas tentativas de suicídio. 

Como dissemos, nem os atentados à própria vida ou as demissões duvidosas impediram Charlie de passar por uma dezena de instituições e provocar todas essas mortes.

O enfermeiro da noite só finalizou sua sequência de assassinatos em dois mil e três, quando uma colega, a também enfermeira Amy LÔUGREN, ajudou a polícia a extrair dele uma confissão. Eles eram amigos muito próximos e trabalhavam no mesmo hospital, que abriu uma investigação para apurar a causa mortis de alguns pacientes – daquelas que se deram em circunstâncias suspeitas.

Amy percebeu que os relatórios de retirada de medicamento de Charlie estavam irregulares, juntou as pontas durante a investigação policial e conseguiu fazer com que ele lhe contasse a verdade usando uma escuta, em uma conversa de aproximadamente três horas.

Mesmo dando nomes e métodos, ele nunca explicou a ela ou a qualquer outra pessoa a RAZÃO ou a MOTIVAÇÃO de seus atos para além daquela desculpa de que estava ajudando as vítimas a se libertarem do sofrimento. 

Em março de dois mil e seis, três anos após sua prisão, a sentença de Charlie foi dada com base na confissão de quarenta assassinatos em dezesseis anos de atuação como enfermeiro. Cullen pegou DOZE prisões perpétuas e estará elegível à liberdade condicional a partir de DOIS MIL, TREZENTOS E OITENTA E OITO.

Transição para o final

Em uma entrevista gravada pelo programa norte-americano SIXTY MINUTES, OU SESSENTA MINUTOS, Charles Cullen fala, abre aspas: “No primeiro emprego, trabalhei na sessão de queimados do hospital. Tinha muita dor, muito sofrimento. Eu não soube lidar com aquilo tão bem quanto achei que lidaria”, fecha aspas. 

Essa declaração, bem como toda a história de Charles Cullen, traz algumas reflexões muito importantes. Alguns questionamentos precisam ser abordados para evitar que a história se repita.

Uma das principais reflexões é sobre saúde mental. Só por essa entrevista de Cullen já fica claro que ele não tinha capacidade emocional para lidar com outras pessoas, muito menos ser responsável por administrar seus medicamentos.

Outro ponto é sobre a responsabilidade das instituições de saúde nessas mortes. Por que não houve checagem? Por que os hospitais simplesmente dispensavam o funcionário sob conduta suspeita e não passavam essa informação para a frente?

O filme Enfermeiro da Noite, que é uma ficção baseada em fatos reais, ou seja, tem seus momentos fantasiosos, baseados em licença poética, nos traz a resposta para os crimes de Charlie, mas ela é dúbia. 

Na produção, quando Amy, personagem interpretada por JESSICA CHASTAIN, questiona Charlie, vivido por EDDIE REDMAYNE, a razão de tantos assassinatos, ele diz: “porque eles não me impediram”.

Em um primeiro momento, pensamos nas vítimas, que decerto não poderiam impedi-lo. No segundo momento, podemos interpretar que a fala é sobre os hospitais, que PODERIAM impedi-lo e não o fizeram.

Ele pulou de emprego em emprego sem nunca ser parado, questionado ou investigado a fundo.

Hoje, com a tecnologia que temos, e todas as regras de compliance que hospitais, clínicas e laboratórios precisam seguir, é infinitamente mais rápido detectar um óbito suspeito, se compararmos com o período em que Charlie esteve na ativa, de mil novecentos e oitenta e oito até dois mil e três. 

Um exemplo bem recente é a ocorrência da morte suspeita de cinco bebês em uma unidade neonatal em Córdoba, na Argentina, registrada em agosto deste ano. Na investigação policial, solicitada pelo hospital para confirmar ou descartar negligência médica e ato intencional, foi pedido o AFASTAMENTO PREVENTIVO de membros das equipes responsáveis pelos cuidados com as vítimas e outras autoridades hospitalares. Isso garante a isenção no processo, além de evitar novos óbitos CASO seja comprovado a intenção de matar de algum ou alguns agentes de saúde.

Esse é o mínimo esperado do hospital, que busca auxílio policial para investigar óbitos com eventuais inconsistências, e da própria justiça, que precisa agir com rapidez e rigor ao menor sinal de perigo de morte a mais pessoas. Naquela época, nada disso foi feito.

Por fim, o último ato de Cullen, em juízo, nos traz também à reflexão. Quando sentenciado, o estado de Nova Jersey poderia aplicar a pena de morte ao condenado, mas, por mais mais irônico que possa parecer, Charles Cullen pediu ao juiz que não colocasse em seu destino a injeção letal. Em troca, ele ajudaria a polícia nas investigações dos próprios crimes.

Uma pessoa que tenta se matar vinte vezes, e que pode ter assassinado mais de quatrocentas, pessoas chegar na frente do juíz e estabelecer uma proposta que só valeria SE não houvesse pena de morte é no mínimo esquisito, não?

A morte foi tudo o que ele buscou, afinal, mesmo que suas credenciais acadêmicas o permitissem trabalhar com a VIDA.

O caso de Cullen também resultou em mudanças políticas na Pensilvânia e em Nova Jersey. Em 2005, o então Gov. Ed Rendell assinou uma legislação que protege os empregadores da Pensilvânia de serem processados ​​por histórias de trabalho que divulgam sobre funcionários atuais ou ex-funcionários, em grande parte como resultado do caso Cullen.

{Comentários pessoais}

A primeira vítima de Charles Cullen, aquele juiz que recebeu o atestado de óbito com uma síndrome de Stevens-Johnson, traz um ponto interessante. Não é preciso ser da área de saúde para notar o óbvio: se o homem morreu de uma síndrome raríssima causada por alergia a medicamentos, a princípio, sua morte não pode nem ser classificada como erro médico, porque é uma questão imprevisível e não um erro de conduta hospitalar. 

Hoje temos aí inúmeras possibilidades de registrar alergias, fazendo risco-cirúrgico ou avisando às equipes sobre reações adversas a determinados medicamentos, mas naquela época isso não existia. 

Então, Cullen poderia até sair ileso dessa denúncia, se essa fosse a única morte suspeita sob sua vigília.

Vem cá, alguém tem dúvidas de que sua escolha pelo curso foi baseada em seu impulso de matar?

Pensa comigo: ele poderia ser advogado, publicitário, carteiro, qualquer coisa, mas decidiu seguir pela enfermagem, uma profissão em que teria livre acesso a pessoas e a dosagens letais de medicamentos, muitas vezes até sem despertar alerta.

Uma de suas vítimas era uma senhora de mais de 90 anos. Em idade avançada, internada, com todas as fragilidades do tempo e os perigos do hospital, onde infecções e outros contágios podem ocorrer rapidamente, não seria nada absurdo que alguém tratasse o caso como morte natural. A princípio, quem desconfiaria que um HOMICÍDIO ocorreu em um leito de hospital?

Nos Estados Unidos a injeção letal é um dos métodos aplicados nos estados onde a pena de morte é legal, como alternativa à cadeira elétrica. 

Ou seja, o que Cullen fazia era criar seu próprio corredor da morte, sentenciando à injeção aqueles que ele achava que caberiam na sua descrição fatal, sem direito sequer a um julgamento ou, indo além, sem que essas pessoas tenham ido a juízo por qualquer coisa.

Porém, por mais que Charles Cullen tenha declarado que o objetivo de suas ações era “dar às pessoas uma morte digna e sem sofrimento”, as pessoas que ele matou não pediram por uma eutanásia na justiça, e também não há registro algum de que tenham solicitado isso em sigilo ao assassino – o que, se tivesse ocorrido, de qualquer forma, seria ilegal na região em que ele atuava.

Isso significa que Cullen decidiu ceifar a vida de suas vítimas por conta própria. Ele interpretou a situação daquelas pessoas da forma que quis e tomou uma decisão que não lhe cabia. 

Se devemos levar em conta que ele apresentou, por toda a sua trajetória, sérios transtornos mentais, é outra história. Fato é que o título de “anjo da morte” é, apenas, o apelido para “assassino de uniforme hospitalar”.

Esse caso foi muito pedido por causa do filme Enfermeiro da Noite, já disponível em um serviço de streaming perto de você, estrelado pelos vencedores do Oscar Jessica Chastain e Eddie Redmayne. Eu te vejo no próximo caso!

Fontes:

Restrições de checagem de antecedentes nos EUA:

https://www.eeoc.gov/laws/guidance/background-checks-what-employers-need-know

Obituário de John Yengo, primeira vítima: https://www.nytimes.com/1988/06/15/obituaries/john-w-yengo-sr-72-ex-judge-in-jersey-city.html   

O que é a Síndrome de Stevens-Johnson:

https://www.mdsaude.com/dermatologia/sindrome-de-stevens-johnson/

Significado bíblico de anjo da morte:

https://www.respostas.com.br/o-que-e-o-anjo-da-morte/

Linha do tempo das vítimas:

https://www.seventeen.com/celebrity/movies-tv/a41793010/the-good-nurse-charles-cullen-victims-timeline/

Michael Strenko:

https://www.poconorecord.com/story/news/2004/05/21/parents-cullen-s-youngest-victim/51067030007/

Pena de morte nos EUA:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pena_de_morte_nos_Estados_Unidos

Sobre Charles Cullen:

​​https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Cullen

Freak TV: https://www.youtube.com/watch?v=8-GeB3kL0UA

Casos e Mistérios: https://www.youtube.com/watch?v=KK-SRGuUJIc

Limiar da Linguagem: https://www.youtube.com/watch?v=cXHYFzlwJG0

Caso de Córdoba: https://noticias.r7.com/internacional/morte-suspeita-de-cinco-bebes-em-hospital-comove-a-argentina-16082022

EXCERTOS

Charles era visto carregando seringas e bolsas de soro adulteradas pra lá e pra cá. De vez em quando ele até entrava em quartos de pacientes cujos cuidados não estavam na sua escala de plantão, ou seja, estavam sob a responsabilidade de outro enfermeiro.

Enquanto as pessoas desconfiavam de que tinha algo errado acontecendo, mas não tinham provas sequer para fazer uma acusação formal contra Cullen, ele recebeu o apelido de ANJO DA MORTE.

Esse apelido traz uma referência do cristianismo, que é o ANJO, mas a Bíblia não traz registro de um anjo da morte específico. Em algumas passagens, como nos livros de Samuel, dos Reis e Apocalipse, é dito que Deus enviava anjos para tirar a vida de alguém ou acompanhar a passagem de alguém que estava morrendo.

O problema com esse apelido é, justamente, sua inconsistência. Nessa interpretação, os anjos eram enviados para cumprir ordens superiores, digamos assim. Só que Charles, obviamente, não cumpria ordens de ninguém

Quem curte analisar Casos Reais sabe que muitos criminosos se escondem em plena vista para não serem considerados suspeitos. É o cara que mata a pessoa, esconde o corpo e participa das campanhas de busca, sempre muito preocupado. É a mulher que envenena a comida lentamente e se descabela no velório pela perda que teve… enfim.

O que Charles Cullen fez, de certa forma, foi isso: escolheu uma profissão que, a princípio, não o colocaria no papel de suspeito. Pessoas morrendo em hospitais, como dissemos, é MUITO normal.

Hoje temos muito mais recursos para entender a conduta das equipes hospitalares do que tínhamos em 1988, quando ele começou a trabalhar com enfermagem. 

Ah! Lembra que falei, mais cedo, sobre o apelido do anjo da morte e como ele seria inconsistente? Isso ficou provado no julgamento de Cullen. 

O filme ilustra a forma de Charlie matar através da adulteração das bolsas de soro com insulina ou digoxina, ambas substâncias que, na dosagem errada, ou em uma aplicação desnecessária, passam do status de REMÉDIO para o de VENENO. 

Ao fazer esse tipo de modificação nas bolsas, ele ganharia tempo, já que a morte não ocorreria exatamente no momento em que ele entrasse no quarto com o equipamento médico. 

Mas o mais bizarro é pensar que esse tipo de operação transformava sua matança em uma loteria macabra. Outros profissionais poderiam utilizar bolsas adulteradas e acabar levando a óbito pessoas que, digamos, não estavam no script.

Você já parou para pensar que uma ligação feita para o patrão anterior, só como checagem de antecedentes, poderia ter posto um fim nessa história muito antes de ela escalar assustadoramente? As coisas que o afastaram da marinha, e cada atitude que o tirava de um emprego, por si só já seriam fortes sinais de que não se tratava de uma figura com ESTABILIDADE MENTAL para cuidar de pessoas.

Só que não há registros de checagem, nas fontes que a gente pesquisou, e é bem possível que os hospitais tenham passado por cima de possíveis “avisos” para suprir a necessidade de seus quadros de funcionários. Lembra que, nos anos noventa, havia muita demanda por enfermeiros e poucos profissionais disponíveis?  

Aliás, não fica claro nos registros públicos e nas reportagens sobre ele como ele entrou na escola de enfermagem se, lá no início, ele tinha escolhido sair da escola para entrar na Marinha. Sabemos, no entanto, que ele foi eleito presidente de sua turma na classe de enfermagem. O caso todo é que parece que ele passou por diversos hospitais sem ser questionado.

Mas uma segunda reflexão, igualmente importante, é sobre até que ponto a gente pode colocar o peso dessa escolha dele, de matar pessoas, na sua frágil saúde mental. Milhares de pessoas sofrem traumas similares e acabam desenvolvendo transtornos mentais, como depressão, e nem por isso elas saem por aí matando geral.

Enfim, é apenas uma reflexão, e cada um tira dela a conclusão que bem entender.

Indo aos fatos: Charles Cullen foi preso em 2003, no Hospital em que ele trabalhava na época, depois que uma colega de trabalho conseguiu extrair dele uma confissão por escuta. 

Ele foi condenado em 2006 a ONZE penas de prisão perpétua por seus crimes. 

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